|   Jornal da Ordem Edição 4.286 - Editado em Porto Alegre em 26.04.2024 pela Comunicação Social da OAB/RS
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NOTÍCIA

02.06.14  |  Trabalhista   

Varredora que não dispunha de banheiros e lugares adequados para fazer suas refeições deve ser indenizada

Ao apreciar o caso, o relator afirmou que a comprovação dos fatos alegados pela trabalhadora foi feita com provas robustas. O magistrado destacou seis relatos, além do depoimento da própria autora, emprestados de reclamatórias trabalhistas contra a mesma empresa.

A Delta Construções S/A foi condenada a pagar indenização por danos morais de R$ 10 mil a uma trabalhadora. A funcionária alegou ser obrigada a comer em locais públicos, sem higiene, além de sofrer constrangimentos ao ter que utilizar banheiros emprestados. A decisão, da 3ª Turma do TRT4, reforma sentença da 4ª Vara do Trabalho de Pelotas, que julgou improcedente o pleito.

O entendimento da Turma foi de que "há um cristalino retrocesso social quando passamos a admitir que, dada a natureza externa do labor - limpeza das ruas do Município de Pelotas -, o trabalhador possa ser privado de direitos tão comezinhos, como o de usar o banheiro para a satisfação de suas necessidades fisiológicas ou o de ter um local adequado para fazer suas refeições. Se o Judiciário Trabalhista concluir ser incensurável esse proceder, estará avalizando violações das mais perversas no mundo do trabalho".

A atividade da empregada consistia em realizar serviços gerais de varrição nas ruas de Pelotas. Na petição inicial, alegou que sequer banheiros químicos eram disponibilizados pela empresa durante a jornada de trabalho. Também afirmou que, em razão da inexistência de refeitórios, era obrigada a consumir comidas frias ou já deterioradas pela falta de acondicionamento adequado. Ainda segundo relatou, era necessário fazer necessidades fisiológicas em campos ou perto de árvores, e passava pelo constrangimento e humilhação de não ter um lugar adequado para realizar sua higiene pessoal.

O juízo da 4ª VT de Pelotas, entretanto, não acolheu os argumentos da trabalhadora, porque considerou que a natureza externa do trabalho faz com que os empregados se submetam a condições diferentes daqueles que exercem suas atividades dentro de fábricas ou outros estabelecimentos. Na sentença, o juiz também argumentou que muitos trabalhadores compartilham dessas mesmas condições e nem por isso pode-se dizer que todos sejam vítimas de danos morais a serem reparados. Ainda, do ponto de vista do magistrado de primeira instância, não se pode afirmar que o trabalho externo, por si só, torne os ambientes inóspitos para refeições, sendo que muitas vezes os locais podem ser até mesmo "muito aprazíveis". Descontente, a empregada recorreu da decisão ao TRT-RS.

Ao apreciar o caso, o relator do recurso na 3ª Turma, juiz convocado Marcos Fagundes Salomão, afirmou que a comprovação dos fatos alegados pela trabalhadora foi feita com provas robustas. O magistrado destacou seis relatos, além do depoimento da própria autora, emprestados de reclamatórias trabalhistas contra a mesma empresa.

Em um dos depoimentos, uma empregada declarou que precisava utilizar banheiros emprestados e que nem sempre isso era possível, porque os proprietários recusavam-se a emprestar ao ver as suas roupas sujas por causa do trabalho. Outro depoente afirmou que precisava aquecer sua comida em latas, utilizando-se de álcool para acender fogo. Os reclamantes também afirmaram que a comida muitas vezes "azedava" por ficar muito tempo fora de um ambiente adequado para sua conservação.

Para o relator, os depoimentos compõem um "cenário abjeto". Na opinião do magistrado, evoluiu-se muito pouco em 500 anos no Brasil, o que se reflete na aparente impossibilidade de não nos colocarmos no lugar do outro, com um olhar de humanidade e justiça. "Não nos indignamos ao vermos seres humanos alimentando-se feito bicho, na rua, junto a toda sorte de detritos. Somos capazes até de pensar ser ‘aprazível’ almoçar naquelas condições. Aceitamos passivamente que trabalhadores, pais e mães de família, façam suas necessidades fisiológicas no mato", ponderou. "Nenhuma atividade laboral, por mais específica que seja a sua natureza, justifica essa desumanidade", frisou.

De acordo com Salomão, se o Poder Judiciário concordar com essa conduta, estará avalizando a institucionalização do trabalho degradante, uma das formas da chamada escravidão contemporânea, que reduz o homem a uma "coisa". "A sociedade como um todo, a despeito da imprescindibilidade de determinados trabalhadores – como o são os que realizam a limpeza das vias urbanas, caso da autora – trata-os com indisfarçável desprezo", observou. O juiz também embasou seu ponto de vista na Norma Regulamentadora nº 24 do Ministério do Trabalho e Emprego e em julgados do TST.

Salomão arbitrou o valor da indenização em 50 remunerações recebidas pela trabalhadora. Entretanto, o desembargador Gilberto Souza dos Santos observou que a empresa possui diversas ações neste mesmo sentido e que o Ministério Público do Trabalho pode, eventualmente, pleitear indenização por danos coletivos. O magistrado também observou valores aplicados pelo TRT-RS em ações semelhantes e optou por fixar em R$ 10 mil o valor, no que foi acompanhado pelo desembargador Ricardo Carvalho Fraga.

O número do processo não foi divulgado.

Fonte: TRT4

Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759

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